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quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

CLONES 2

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Segundo Trounson, muitos problemas que aparecem na gestação, como a placenta anômala e o crescimento exagerado do feto, podem estar relacionados à reprogramação de certos genes. Lygia da Veiga Pereira, especialista em genética molecular e professora da USP, tem a mesma opinião. Lygia se refere a um fenômeno natural chamado imprinting, uma espécie de carimbo que certos genes recebem, dependendo da origem, materna ou paterna. Todas as células possuem uma duplicata de cada gene. Em algumas delas, só aqueles vindos da mãe funcionam; em outras, apenas as cópias recebidas do pai.
Para transformar uma célula de sangue ou de pele em um novo ser, ou no tecido de algum órgão, todas as informações prévias do núcleo são apagadas para que, no futuro, quaisquer genes sejam ativados. Durante esse processo, é provável que os “carimbos” materno e paterno, fundamentais para o desenvolvimento normal do embrião, também desapareçam. “Uma hipótese para tentativas fracassadas de clonagem é o fato de essas informações do núcleo ficarem atrapalhadas após a reprogramação”, afirma Lygia, que é contrária à clonagem humana. Um gene que deveria se manifestar fica inativo e vice-versa. “Talvez exista alguma característica inerente à biologia dos mamíferos que torne a eficiência da clonagem tão baixa. Não evoluímos para ser duplicados – clonar seres humanos é totalmente antinatural.”
Os defensores da prática discordam. “Ao fazer um clone de alguém, estamos apenas criando um gêmeo univitelino, mas com alguns anos de diferença”, afirma o médico Roger Abdelmassih, que ajudou cerca de 2 400 bebês de proveta a nascerem e não vê problemas em trazer ao mundo outros tantos por meio da clonagem, no futuro. “Muitos casais que perdem seus filhos em acidentes me procuram, pedindo que eu os ajude a ter outro filho. Principalmente as mães em idade avançada”, diz ele. “Se o processo de clonagem já estivesse dominado, não seria lógico dar àqueles casais uma criança com as mesmas características do filho morto?”


Trata-se de uma pergunta espinhosa. Afinal, o primeiro impulso de pais que perderam o filho é tentar trazê-lo de volta. “Clona-se biologia, mas não biografia”, afirma o padre Léo Pessini, especialista em bioética do Centro Universitário São Camilo, em São Paulo. A criança será fisicamente idêntica àquela que morreu. Mas nascerá numa outra época, passará por experiências distintas, terá outra personalidade. Enfim, será outra pessoa. “Hoje, graças à ciência, podemos viver mais e melhor”, diz o padre Léo. “Mas temos de aceitar o fato de que somos mortais. Isso não podemos mudar.”
Para o médico americano Arthur Caplan, do Centro de Bioética da Universidade da Pensilvânia, na Filadélfia, o desejo de clonar um ente querido ou de criar uma duplicata de si mesmo pode esconder sentimentos como egoísmo e vaidade. “Não há meios de trazer de volta uma pessoa morta ou recriar um atleta. Nem com clonagem. Os clones são indivíduos únicos, dotados de livre-arbítrio”, diz ele. Os opositores da clonagem humana discutem se existe ética ou não em qualquer uma das razões arregimentadas em favor da prática. A Igreja Católica, por exemplo, argumenta que não. “A clonagem permite o domínio de um indivíduo sobre outro”, afirma o monsenhor Elio Sgreccia, vice-presidente da Pontifícia Academia pela Vida, com base no Vaticano. “Não se pode impor a alguém uma estrutura física, fabricar uma pessoa a partir da própria vontade e dar-lhe características semelhantes às de outro ser por simples arbítrio. Isso é uma instrumentalização, uma maneira de escravizar.”

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